Monunento Natural

Monumento Natural

(© Art Photography Madeira)

O Monumento Natural do Cabo Girão, categoria III da International Union for Conservation of Nature, é reconhecido pelas suas estruturas geológicas de grande valor vulcanológico, estratigráfico, científico e cultural, que devido à sua raridade, qualidades estéticas inerentes e enquadramento cultural, importa preservar e salvaguardar.

A delimitação de Monumento Natural engloba toda a área de encosta delimitada a Este pelo Boqueirão e a Oeste pela Ribeira da Quinta Grande, a Sul pela base da arriba e a Norte pela linha de início do desnível orográfico (excluindo os terrenos agrícolas).

Esta classificação foi estabelecida para promover a conservação do património geológico, fomentar o conhecimento sobre o mesmo através da investigação científica, sensibilizar o público sobre a sua importância científica, económica e cultural, e promover o desenvolvimento sustentável de atividades socioeconómicas.

Tal intervenção, vem reforçar a já estabelecida classificação de geossítio CL02-Miradouro do Cabo Girão e, uma vez que a geodiversidade é fundamental à manutenção da biodiversidade, complementa o seu enquadramento na Rede Natura 2000 como Sítio de Interesse Comunitário do Cabo Girão.

GEOLOGIA E GEOMORFOLOGIA

O Esboço Geomorfológico do concelho de Câmara de Lobos distingue o relevo do Cabo Girão, associando-o à rede filoniana que lhe serve de suporte, cuja orientação é paralela ao maciço. Refere ainda que “nesta área, a forma das vertentes é condicionada pelos materiais presentes, sendo retilínea quando existe a predominância de mantos, e côncava ou convexa, quando os materiais se apresentam alterados e possuem uma grande percentagem de argilas”1.

A rede filoniana do Cabo Girão desempenha um papel de extrema importância na conservação dos relevos, pois serve de suporte e de fator de resistência à erosão dos materiais piroclásticos, modelando o relevo consoante a presença de filões e criando vertentes com centenas de metros de alturas2.

O Momento Natural do Cabo Girão é caracterizado por arribas, talhadas em empilhamentos de depósitos piroclásticos de quedas e escoadas basálticas, maioritariamente da Unidade da Penha D´Águia (Complexo Vulcânico Intermédio da unidade 2) (CVM2), cortadas por uma densa rede de filões, no topo da arriba do Cabo Girão, afloram ainda escoadas da Unidade do Curral das Freiras (Complexo Vulcânico Intermédio da unidade 3) (CVM3). Tais estruturas geológicas são consideradas de grande valor vulcanológico, estratigráfico, científico e cultural, motivo pela qual integra a “Estratégia de Conservação do Património Geológico da Região Autónoma da Madeira” como geossítio CL02-Miradouro do Cabo Girão desde 20153.

(© Art Photography Madeira)

Segundo a Nota Explicativa da Carta Geológica da ilha da Madeira, o CVM2 compreende sequências vulcânicas máficas (basanitos e basaltos) resultantes de atividade efusiva e explosiva subaérea, de estilo estromboliano, havaiano e, ocasionalmente, do tipo freatomagmático, assim como, sequências sedimentares epiclásticas. As sequências de derrames lávicos desta unidade (CVM2b) formam geralmente grandes empilhamentos de escoadas (basaltos e basanitos), do tipo aa, de espessura reduzida, apresentando-se geralmente pouco alteradas. Intercalados nos derrames lávicos e em áreas afastadas das bocas eruptivas, ocorrem níveis de piroclastos de queda distais (tufos de lapilli e cinzas), geralmente muito compactos e pouco espessos, assim como produtos de atividade freato - magmática. Os depósitos piroclásticos máficos subaéreos (CVM2 pi) integram, indiferenciadamente, tufos de escórias e lapilli de cones estrombolianos/havaianos, piroclastos de queda distais e ocasionais produtos freatomagmáticos4.

Na parte superior da arriba do Cabo Girão, surgem afloramentos do Complexo Vulcânico Intermédio, nomeadamente da Unidade do Curral das Freiras (CVM3), constituída, por sequências lávicas resultantes de atividade predominantemente efusiva subaérea (CVM3 b), com ocasionais intercalações de depósitos piroclásticos de queda (escórias, lapilli e cinzas basálticas), níveis de tufitos e ocasionais produtos máficos de atividade freato-magmática.

É ainda de realçar a presença de paleovales preenchidos por escoadas provenientes de derrames lávicos do Complexo Vulcânico Superior, a fase vulcânica mais recente na ilha. Estas estruturas geológicas particularmente evidentes no sítio do Rancho, são consideradas de grande valor vulcanológico, estratigráfico, científico e cultural” 4.

GEODINÂMICA EXTERNA DO CABO GIRÃO

Cerca de 52,8% do concelho de Câmara de Lobos apresenta suscetibilidade “elevada” a “muito elevada” à ocorrência de movimentos de vertente, principalmente em áreas com inclinações acentuadas e taludes subverticais de elevada altitude, como o Curral das Freiras e o Cabo Girão, devido à sua acentuada orografia e o grau de incisão hidrográfica.

(© Art Photography Madeira)

Este tipo de evento geomorfológico é recorrente na Área Protegida do Cabo Girão, e caracteriza-se pelas quedas de blocos e desabamentos como movimentos de massa simples, de transporte aéreo, rápido e com material de tamanho variável, podendo causar elevados danos, principalmente nas fajãs, como a destruição total ou parcial de culturas agrícolas ou das infraestruturas de apoio à atividade. A experiência dos agricultores com este tipo de ocorrência fez com que construíssem os seus edificados de apoio agrícola estrategicamente junta à base da arriba, reutilizando antigas escavações.

Um dos movimentos de massa mais significativos, ocorreu a 4 de março de 1930, entre a Fajã dos Asnos e a antiga pedreira aí existente. Embora sem informação técnica detalhada, o acontecimento mereceu destaque na imprensa da época por ter desencadeado um tsunami, que ao atingir a Praia do Vigário, ocasionou 19 vítimas mortais e vários feridos. Uma vez que na base da arriba era efetuada a extração de inertes, levantou-se a possibilidade deste evento poder ter influência antrópica, pela mesma ter provocado falta de suporte das formações geológicas sobrejacentes.

Destas galerias era feita extração de tufo de lapilli, conhecido por “cantaria mole do Cabo Girão”, uma rocha piroclástica de cor castanho/avermelhada, porosa com uma composição essencialmente de óxidos e hidróxidos de ferro. A pedra extraída foi utilizada na construção de alguns grandes monumentos e edifícios da ilha, como a Sé Catedral do Funchal, o Convento de Santa Clara, Forte de São Tiago, edifício da Câmara Municipal do Funchal, Museu da Quinta das Cruzes, entre outros.

A importância da antiga pedreira e o volume dos blocos de pedra extraídos foi de tal ordem que, o Rei D. Manuel I ordenou a construção de embarcações com características específicas para o transporte desde o Cabo Girão até à cidade do Funchal7.

Notas de rodapé

1 Abreu, U., Rodrigues, D., & Tavares, A. (2007). Esboço Geomorfológico do Concelho de Câmara de Lobos (ilha da Madeira). Tipologia de Movimentos de Vertente. Publicações da Associação Portuguesa de Geomorfologia, 5, 75-92.

2 Hartnack, W. (1930). Madeira: Landeskunde einer Insel (Vol. 42). Friederichsen, de Gruyter & Company mb H..

3 Brum da Silveira, A.; Prada, S.; Ramalho, R.; Madeira, J.; Fonseca, P.; Canha, E.; Brilha, J. (2012). Inventariação do Património Geológico da Ilha da Madeira. Secretaria Regional do Ambiente e Recursos Naturais - Relatório Final, 414 p. In: https://geodiversidade.madeira.gov.pt.

4 Silveira, A. B., Madeira, J., Ramalho, R., Fonseca, P., Prada, S. (2010). Notícia Explicativa da Carta Geológica Da Ilha Da Madeira na escala 1: 50.000.

5 CMCL. 2011. GEORISCO. Análise, gestão e operacionalização do risco – Relatório compósito do Plano Diretor Municipal de Câmara de Lobos. Departamento de Gestão e Ordenamento do Território do Município de Câmara de Lobos.

6 CMCL (2018). Avaliação Estratégica Ambiental. Revisão do PDM de Câmara de Lobos, pp.96-106.

7 Pereira, E. C. (1989). Ilhas de Zarco (vol. II). Funchal, CMF.